TEXTO 3
FILOSOFIA E GÊNERO
O
objetivo, neste momento, não é reforçar as diferenças biológicas. Também não se
deve reforçar a divisão social do trabalho e do lazer. O gênero sexual deve ser
encarado como uma questão ética e política, ou seja, refere-se a ações de indivíduos
(ética pessoal) e também a ações coletivas (política) que implicam respostas e
soluções sociais para construção de convívio democrático, sem discriminações de
natureza sexual. Tendo em vista que essa reflexão está enraizada profundamente
na cultura.
Em
meio à Revolução Francesa, foi proclamada a Declaração dos Direitos do Homem e
do Cidadão. Durante os debates sobre essa declaração, Olympe de Gouges elaborou
aquela que incluía “os Direitos da Mulher e da Cidadã”, pois, apesar de se
procurar a igualdade universal, as mulheres não estavam nela inseridas nem
mesmo teoricamente. A sua atitude revela que o direito inscrito em uma lei não
significa direitos objetivados no mundo cotidiano. A igualdade da lei pode
significar apenas igualdade de alguns; no caso, igualdade entre os homens. Isso
significava que apenas os homens eram cidadãos, e as mulheres não. Era preciso
declarar que as mulheres eram cidadãs e deveriam exercer os seus direitos.
Declaração dos direitos da mulher e da Cidadã - Olympe de Gouges 1791
Mulher,
desperta-te; a força da razão se faz escutar em todo o universo; reconhece teus
direitos. O poderoso império da natureza não está mais envolto de preconceitos,
de fanatismo, de superstição e de mentiras. A bandeira da verdade dissipou
todas as nuvens da tolice e da usurpação. O homem escravo multiplicou suas
forças e teve necessidade de recorrer às tuas, para romper os seus ferros.
Tornando-se livre, tornou-se injusto em relação a sua companheira. Oh mulheres.
Marie Gouze, a Olympe de Gouges (Feminista francesa ) 1748 - 1793
Feminista francesa nascida em Montauban, próxima à Toulouse, sul do
país, que liderou um movimento por uma vida mais digna para a mulher durante a
Revolução Francesa (1789). De origens na pequena burguesia e apesar de muito
inteligente e bonita, teve uma educação muito pobre. Semi-analfabeta não sabia
ler corretamente como também escrever, e depois ditou todo seu trabalho para
seu secretário. Apesar dos seus múltiplos problemas, moveu-se para Paris como
uma pré-revolucionária e adotou o nome de Olympe de Gouges, que julgava soar
mais atraente e aristocrático. Na capital buscou contato com círculos mais
finos e culturais e os salões. Com o apoio de um amante que era autor de
teatro, aceitou a difamação de ser chamada de prostituta para alcançar seu
sonho que era de se tornar escritora. Atuou no Comédie Francaise, o conservador
teatro francês apoiado pelo rei. Uma de suas primeiras peças em Paris tornou-se
um assunto político imediatamente. Era uma peça sobre a escravidão nas
colônias: L´Esclavage dela ao Nègres. Ganhou a ira do Prefeito de Paris o que a
fez escrever com mais vingança. Participou ativamente das atividades
revolucionárias (1789) e visitou as sessões de assembléia nacional
regularmente. Ela transformou suas idéias em sugestões para medidas
sócio-políticas e se tornou o foco de discussão por toda Paris. Com a
publicação de seu artigo Declaração dos Direitos de Mulheres e Mulheres
Cidadãs, tornou-se a primeira pessoa a formular um documento compreensivo sobre
direitos humanos de cidadãos. O documento causou excitação ao longo da França e
no estrangeiro. Seu documento As Três Urnas ou O Bem-estar da Pátria a
conduziram a prisão, acusada de partidária dos Girondistas, partido excluído do
governo. Neste livro defendia um referendo sobre três possíveis formas de
governo: republicano, federativa ou monarquia. O mais grave ainda para os
radicais, ela tinha defendido o rei publicamente, alegando razões humanitárias
e pregando uma reforma de sociedade com palavras, pela razão e não com
violência. Como feminista publicou textos sobre os direitos da mulher,
afirmando que se elas poderiam ser levadas ao calabouço, também tinham o
direito de subir na tribuna política. Levada ao tribunal revolucionário,
acusada de propaganda para reinstalar a monarquia, foi julgada, condenada à
morte e guilhotinada (1793). Porém suas idéias não morreram e alguns anos
depois fez surgir nos EUA outras manifestações, como a de Margaret Fuller
(1810-1850), uma das primeiras jornalistas femininas.
Simone
Lucie-Ernestine-Marie Bertrand de Beauvoir, mais conhecida como Simone de
Beauvoir (Paris, 9 de janeiro de1908 — Paris, 14 de abril de 1986), foi uma escritora, filósofa existencialista e feminista francesa. Escreveu
romances, monografias sobre filosofia, política, sociedade, ensaios, biografias
e uma autobiografia.
Gênero
Questões:
O que faz um homem ser homem e uma
mulher ser mulher – o corpo, o pensamento ou a sociedade? Quem decide as
funções sociais da mulher e do homem – o corpo, o pensamento ou a sociedade?
Dialogar
e ler – direitos da mulher
Para
Simone de Beauvoir, a condição da
mulher é uma escolha dos homens apoiada pela submissão das mulheres. Para a
libertação das mulheres, elas devem assumir a responsabilidade de mudar a
situação de submissão, pois são seres livres, e só ficarão submetidas ao
preconceito social por escolha própria.
A única
libertação possível das mulheres virá da política, isto é, da união das
próprias mulheres. Elas precisam se encontrar, reconhecer seus problemas,
partilhar ideias, o que quer dizer que precisam lutar juntas. Não há como ser
diferente, pois não se pode esperar que todos os homens abram mão dos seus privilégios
pelas mulheres. Para essa filósofa, não se trata de colocar as mulheres contra
os homens, mas de colocá-las contra o machismo. Contra as situações de
opressão.
Dialogar e
escrever – Filosofia e gênero
Para a filósofa Judith Butler é a sociedade que define
as identidades do homem e da mulher. O corpo físico é só o espaço em que a
sociedade define a sua divisão de trabalho. Homens fazem isto, mulheres aquilo.
Em outras palavras, ninguém nasce homem ou mulher, sendo a sociedade a
responsável por ensinar as crianças a ser homens e mulheres.
Será que existe uma determinação
genética que afirme que meninas deverão lavar louça enquanto os irmãos podem
jogar bola? Ou que as mulheres não deveriam ocupar cargos de chefia? Quando se
divide o mundo em dois gêneros, afirma-se o binarismo do sexo. Ou o indivíduo
se encaixa em um gênero sexual, ou em outro.
A história tem demonstrado que as
funções de homens e mulheres têm mudado com o tempo. Elas não são naturais, não
há uma essência feminina ou masculina. Tudo isso é um posicionamento para
controlar a vida das pessoas. Os meninos têm de ser sempre fortes; e as
meninas, sensíveis. Mas, para Butler, meninos e meninas são criações
artificiais, e aqueles que conseguem entrar no padrão acabam sendo
bem-sucedidos, excluindo-se os demais. Esses encaixes beneficiam principalmente
os homens.
Questão:
Quais as políticas públicas que poderiam colaborar para a superação da
desigualdade social entre homens e mulheres?
Filosofia e
educação
Escola
tradicional:
esta escola se origina na ideia de que o professor fala e os alunos aprendem. O
esforço maior é o uso da memória, é preciso acumular conhecimentos, decorando
nomes, datas, fórmulas e tradições. O professor ensina, o aluno decora, o
professor cobra na prova, oferecendo prêmios aos melhores e incentivando a
competitividade. Outro lado importante é a disciplina rígida. Ao se comportar
mal, o aluno é excluído e punido e não educado, ou seja, não é considerado como
aluno a ser orientado tendo em vista mudanças cognitivas e de atitudes.
Escola
nova:
o aluno é o centro do processo, a partir da compreensão do seu aspecto
psicológico. A escolha dos conteúdos visa ao interesse dos alunos. O professor
é um facilitador, ele desperta a curiosidade e o aluno sai ao encalço de sua
descoberta. O fundamental é a compreensão, e não a memorização dos conteúdos,
isto é, aprender fazendo. As avaliações não supõem competitividade, mas
cooperatividade. O mais importante é um ajudar o outro. A prática do dia a dia
se dá em laboratórios, hortas, passeios, jogos, oficinas e outros. A disciplina
é construída em processo de valorização da autonomia, o aluno deve entender que
é o protagonista de como alcançar seus objetivos.
Escola
técnica:
esta escola quer dar ao aluno o suporte para trabalhar na sociedade industrial.
Seu objetivo é transformar o estudante em mão de obra qualificada. Seu
principal conteúdo é científico e tecnológico, sem tratar com profundidade da
subjetividade. O importante é aprender a profissão, ser cobrado objetivamente
seu uso. O grande problema desse estilo de escola é a razão instrumental que
submete a vida ao mercado. O aluno não é mais uma pessoa, é um funcionário, um
técnico ou um profissional.
Educação
e emancipação
“É bastante conhecida a minha
concordância com a crítica ao conceito de modelo ideal. Esta expressão se
encaixa com bastante precisão na esfera do jargão da autenticidade que procurei
atacar em seus fundamentos. Em relação a essa questão, gostaria apenas de
atentar a um momento específico no conceito de modelo ideal, o da heteronomia,
o momento autoritário é imposto a partir do exterior. Nele existe algo de
usurpador. É de se perguntar de onde alguém se considera no direito de decidir
a respeito da orientação da educação dos outros. As condições – provenientes no
mesmo plano de linguagem e de pensamento ou de não pensamento – em geral também
correspondem a esse modo de pensar. Encontram-se em contradição com a ideia de
um homem autônomo, emancipado, conforme a formulação definitiva de Kant na
exigência que todos os homens tenham que se libertar de sua autoinculpável
menoridade.
A seguir, e assumindo o risco,
gostaria de apresentar minha concepção inicial de educação. Evidentemente, não
a assim chamada modelagem de pessoas, porque não temos o direito de modelar
pessoas a partir do seu exterior; mas também não a mera transmissão de
conhecimentos, cuja característica de coisa morta já foi mais do que destacada,
mas a produção de uma consciência verdadeira. Isso seria inclusive da maior
importância política; sua ideia, se é permitido dizer assim, é uma exigência
política, isto é, uma democracia com o dever de não apenas funcionar, mas
também operar conforme o seu conceito demanda pessoas emancipadas. Uma democracia
efetiva só pode ser imaginada em uma sociedade de quem é emancipado.
Numa democracia, quem defende
ideais contrários à emancipação, e, portanto, contrários à decisão consciente
independente de cada pessoa em particular, é um antidemocrata, até mesmo se as ideias
que correspondem a seus desígnios são difundidas no plano formal da
democracia. As tendências de apresentação de ideias exteriores que não
se originam a partir da própria consciência emancipada, ou melhor, que se legitimam
diante dessa consciência, permanecem sendo coletivistas-reacionárias. “Elas
apontam para uma esfera a que deveríamos nos opor não exteriormente pela
política, mas também em outros planos muito mais profundos.”
ADORNO,
Theodor. Educação e emancipação. Tradução Wolfgang leo Maar. 2. ed. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1995. p 141-142.
Comentário ao texto
Adorno
se refere ao texto de Kant em resposta à pergunta: O que é ilustração? Segundo
o qual um homem emancipado é um homem sem guia, isto é, minoridade é viver sem
a independência que vem do uso da racionalidade.
O
que impede o homem de assumir a sua maioridade é a preguiça e a covardia.
Preguiça de ler, de aprender, de pesquisar, de ouvir e de se cansar em busca de
uma maneira melhor de viver. Covardia em não enfrentar os problemas, os erros,
as decepções, conduzindo à preferência de se manter como uma espécie de criança
imatura. Para tudo se necessita de outro dizendo o que se deve ser e fazer.
Para
quem perguntamos as coisas fundamentais da vida? Quem é o guia? Algum familiar,
como o pai ou a mãe? O professor, o pastor, o padre, o político, o livro, o
filme?
A
minoridade é uma prisão. A maioridade é a libertação. A liberdade vem a partir
do momento em que se assume a racionalidade, a de Immanuel Kant, já utilizada
anteriormente.
A
escola deve ser o palco do esclarecimento para, então, se tornar geradora de
cidadania. O sinal de que isso está acontecendo é o uso público da razão.
Isso
significa assumir posições refletidas, o que é diferente do uso privado da
razão, que é responder racionalmente a situações corriqueiras, como se calar
diante da autoridade.
Quem
tem coragem de usar a razão? Quem tem vontade de superar a si mesmo? Quem usa a
razão só para não ter problemas pessoais (uso privado da razão)? Quem usa a
razão enfrentando o mundo para melhorá-lo (uso público da razão)?
Os
oficiais dizem: não questione, pague. Os religiosos dizem: não questione,
creia. A televisão diz: não questione, assista, compre e seja. O político diz:
não questione, vote.
Entretanto,
a pessoa emancipada questiona abertamente, sabe o que quer e precisa disso para
ser livre. Ela quer saber o motivo, ela precisa entender para aceitar ou não o
que lhe é falado, ordenado. Ela usa os estudos, o raciocínio, a imaginação e a
crítica para seguir o seu caminho. Dessa maneira, a melhor escola é aquela que
permite questionamentos mais profundos.
Questões
1.
Qual é a diferença do uso privado e do
uso público da razão?
2.
Segundo Adorno, o que é educação?